(Para ouvir https://youtu.be/OSye8OO5TkM )

Sensações… A primeira coisa que lhe vem à mente… A sala estava cheia naquela manhã fria. Olhos curiosos, ocupando mesas repletas de equipamentos para análises químicas. Um cheiro residual das substâncias variadas preenchia o ambiente, grudando em tudo. Nenhum deles se importava. Toda a atenção estava na peça delicada de tela, mergulhada em uma bandeja preenchida de um líquido transparente, mas altamente tóxico ao toque. A mulher jovem, de pele negra, vestia equipamentos de proteção enquanto manipulava a amostra, extraindo, delicadamente, parte do verniz escuro da superfície. Sua voz abafada pela máscara era firme e calma.

– … A reação esperada entre uma tela do século XVI e o verniz à base de gordura animal, deveria turvar o sulfato. No entanto, como podem ver, ele apenas se desprende revelando uma camada quebradiça. Indicando…?

Ela ergue o olhar da bandeja e observa a turma interessada. Um rapaz no canto esquerdo diz um pouco tenso.

– … Outra base química?

Silêncio. Os olhos dela percorrem os alunos um a um, parando no homem velho e magro, Ele está encostado a uma das estantes, abarrotada de amostras, além de anotações e etiquetas, numa organizada catalogação. Era fato conhecido, que sua monitora, a moça fazendo as perguntas, insistia em manter tudo rigidamente coerente. Apesar de toda a interferência de outros alunos graduados e pesquisadores mais velhos.

Atenta ela observou… Como o professor não disse nada, prosseguiu.

– Sim. Contudo, há um outro fator. A substância não mudou seu estado e nem causou dano visível à fibra, o que sinaliza, mesmo antes do teste laboratorial, que a base deste verniz é mineral. Logo, e isto é fundamental de ter em mente, há duas possibilidades: o material foi posteriormente envernizado já com técnicas minerais ou este verniz foi colocado aqui para indicar uma idade que esta fibra não tem.

O rapaz pareceu se iluminar com a resposta. Ele a observou e fez anotações, então falou, tão calmo quanto ela.

– Partindo desta análise… A fibra ainda está sem danos e sabemos que o trançado desse período tende a se esgarçar quando embebido em… – Ele parou e a fitou. Ela acenou que continuasse. –... A tela também não é do período!

Palmas no canto da sala. O Professor Kollya adorava quando um aluno chegava a conclusões acertadas. Porém sua monitora sabia que isso podia gerar falsos resultados. Ela aguardou o rapaz fita-lá novamente e concluiu no mesmo tom neutro.

– É um sinal, mas apenas o teste "dois'' vai trazer mais luz a esta hipótese. Mantenha em mente que um Não, definitivamente, não prova um Sim. Apenas abre a pergunta: Porque? Vocês agora sabem que isto – ela aponta o experimento amostra –... não se comporta como uma fibra do século XVI e nem o verniz tem base animal. Contudo isso é o que ele não é. Mas devemos ponderar: o que ele realmente deve ser?

Meia hora depois, ela estava limpando a sala e deixando o material nos lugares corretos. A voz pesada e séria do seu orientador cortou a calma do seu trabalho.

– Eu não me lembro de ser tão duro e misterioso com você Semyonova. Eles são talentosos, deixe-os ter erros honestos.

– Professor… – Sua voz estava cansada. – Erros assim prejudicam o processo. Presumir não é ciência. Hipóteses são apenas perguntas. Lembro muito bem de quando errei a datação daquela moeda e passei o resto do semestre revisando todos os objetos do lote. Não foi prazeroso.

– Mas você aprendeu bastante sobre os etruscos e o processo de forja não foi? Seu artigo ficou primoroso, se bem me lembro.

Olga cravou seus olhos verdes em Kollya com intensidade. Ele era seu professor, orientador e quase um segundo pai. Ela detestava aquele tom, mas não tinha como discutir com alguém que realmente amava o que fazia. Não era maldade deixar que errassem, ele acreditava no poder do aprendizado. Ela estava pronta para uma resposta, quando o rapaz da aula anterior chamou sua atenção. Obviamente, ele ouviu a discussão, mas foi educado o suficiente para não se fazer notar.

– Pois não? - Kollya falou tranquilo. Como se a moça não estivesse irritada ao seu lado.

Era óbvio que ela não poderia fazer nada. Apenas se despediu o melhor que pode dos dois, enquanto recolhia suas coisas. Provavelmente aquele rapaz já estava na mira do professor, ela iria sair em pouco mais de um ano, era bom ver que seria substituída por alguém competente. Prestaria atenção em seu nome no futuro. Absorvida por estes pensamentos não viu Petr se aproximar. Ele beijou-lhe a testa sorrindo antes de saudar seu orientador e o aluno que lhe escapara o nome.